Caracol destaca sabores brasileiros com tempero internacional

Pulsando entre tendências, o bar e restaurante se inspira nos listening bars e festas nova-iorquinas para celebrar a produção nacional.

O que garante a longevidade de um bar? Em um mundo em constante transformação, atrair o público com cartas de drinks e menu apurados segue sendo fundamental, mas alie a isso novos desejos e tendências. Os listening bars, bares com sistema de som requintado, vêm conquistando o coração – e os ouvidos – dos paulistanos.

Na decoração, as garrafas de bebida dividem espaço com a seleção cuidadosa de LPs. Num mundo onde o streaming faz parte do dia a dia, a mídia física se conecta a tempos mais simples, nos quais a curadoria de músicas faz toda a diferença. 

Como camaleões, esses locais entregam menu de alta qualidade e acústica impecável – em ambos os casos dificilmente seria possível reproduzir em casa, tanto as receitas dos drinks, quanto a qualidade sonora. O Caracol, dos sócios Millos Kaiser e Thiago Visconti, é um bom exemplo disso. 

Inicialmente, em 2018, a casa se destacou pela caixa de som vintage e pista intimista. Desde 2023, reposicionado na Barra Funda, o espaço ganhou dois andares e atmosferas distintas. 

Cada ambiente oferece uma experiência sonora específica, pensada para valorizar tanto um mood mais gastronômico – esse, sim, aliado ao conceito do jazz kissa (bares de audição japoneses) –, quanto o de cima, com uma pista espaçosa onde os graves e grooves se encontram sob o globo de luz.

“A música foi o que nos motivou a abrir um bar. A ideia era inaugurar um lugar bom para se ouvir música de qualidade, algo que não havia em São Paulo na época”, conta Millos Kaiser, DJ e um dos sócios do Caracol. 

Para dar conta da demanda, o Caracol expandiu o horário de funcionamento: sexta e sábado, o segundo andar vai até altas horas da madrugada, e as tardes de domingo são dedicadas aos sets mais solares, com DJ tocando para a rua.

Na coquetelaria, o bar-restaurante apresenta uma carta bem estruturada, que transita entre clássicos com gin, whisky, tequila, rum e cachaça, com uma seleção de coquetéis autorais que surpreendem pela originalidade. Os drinks assinados por Gunter Sarfert  chamam atenção não apenas pelos nomes irreverentes e divertidos, mas também pelo cuidado na escolha dos ingredientes brasileiros e no equilíbrio dos sabores.

Peculiaridades do soundsystem

Para além desses fatores, um dos grandes diferenciais do Caracol é seu sistema de som, com equipamentos analógicos, criado para dar orgulho a qualquer audiófilo. “Nos inspiramos no setup de David Mancuso (DJ americano) usava no Loft, festa seminal de Nova York, que durou mais de três décadas e inspirou diversos projetos mundo afora”, garante o proprietário. “Já no segundo andar, nós temos um clube propriamente dito, o que requer um sistema de som mais moderno e parrudo”.

Ao longo dos anos, mais de três mil DJs já se apresentaram por lá. Por mês, mais de 20 artistas são escalados para embalarem os ambientes. Segundo o curador musical e stage manager Viswambhara Däs (Swam), o Caracol não segue uma identidade sonora fixa.

“Temos algumas constantes como disco, house, dance, balearic – que são os gêneros mais fortes –, mas a gama musical é muito ampla. Em um dia você pode ouvir temas raros de jazz japonês; no outro, um garimpo refinado de música árabe tradicional. Essa imprevisibilidade é, de longe, nossa maior virtude”, afirma o programador musical.

E, claro, há o vinil, um dos elementos centrais da experiência nos listening bars. Mais do que um formato de reprodução, ele carrega uma forte carga simbólica e afetiva, especialmente para colecionadores e para quem valoriza o prazer de ouvir algo raro. Lê-se: tracks impossíveis de encontrar na internet.

Para Swam, os discos proporcionam uma abordagem diferente daquela do digital, e isso contribui para aproximar o público da tão buscada experiência sonora: “Um DJ precisa conhecer bem seus discos para extrair o melhor de cada um e traduzir essas nuances em seus roteiros sonoros. O digital, de certa forma, facilita esse processo, mas também o esteriliza”, explica.

Além disso, o vinil carrega uma identidade sonora singular, que se revela de maneiras distintas em cada sistema de som – por meio de ondas sonoras contínuas, harmônicos e texturas sutis. 

É justamente a combinação entre uma coquetelaria bem pensada, música de qualidade, ambientação cuidadosa e a constante busca por reinvenção que faz com que um lugar conquiste e mantenha seu público fiel, sem perder de vista o propósito que o trouxe até ali: entregar com consistência. Ou seja, servindo bem para servir sempre.

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